sexta-feira, 26 de abril de 2013

Os 3 desejos.

Senta e conversa um pouco aqui comigo, pediu-me olhando nos meu olhos. Tipo de tática covarde, não tinha como escapar. Concordei meio sem graça de dizer não, afinal o alimentava de quando em vez... Olhei em volta e acabei por sentar no gramado, por falta de opção. Entre sorrisos desajeitados pensava no que falar. Não dava para perguntar se estava gostando da comida. Ele sequer tinha olhado pra ela, ignorou-a como se já estivesse farto. Pensei que dessa vez tinha passado dos limites, tudo bem ser chegada numa encrenca, mas...
Ele quebrou o gelo:
_ Vou te conceder três desejos. Escolha!
Ri um pouco, olhei para os lados e resolvi entrar na onda. 
_ Vejamos... primeiro saúde. Saúde pra mim e para toda minha família, descendentes e ascendentes. Saúde física, moral, espiritual. Equilíbrio total de corpo, mente e espírito. Para sempre... por todas as gerações!
_ Feito. Nunca vi alguém pedir algo tão detalhadamente... mas pode deixar, tá anotado.
_ Precisa dos nomes? 
_ Não, não preciso de nada.
Ele deu um espiada no jardim e resmungou sobre as formigas e cupins.
_ Seu segundo pedido?
_ Deixa eu pensar... olha é meio radical, não sei se está ao seu alcance.
_ Não se preocupe, não tenho limites. E sou chegado coisas radicais.
_ Então tá... quero subverter algumas prioridades nacionais. De agora em diante o brasileiro (todooooooooooooooo povo brasileiro, presta atenção) vai falar, pensar, acompanhar, se preocupar, se envolver e gostar MAIS de política, economia e educação do que de futebol, carnaval e cerveja.
_ Não é uma boa idéia... 
_ Mas o senhor disse que gostava de radicais. Vai estragar meu desejo? 
_ Não é isso. É que você não sabe a confusão em que vai se meter pedindo algo assim. Mas se é isso que quer... considere feito.
Tinha gente passando por ali e olhando pra nós dois. Ele sentado em seu trono - uma cadeira de praia velha recoberta por um toldo de plástico - e eu parecendo uma criança sentada na grama, me coçando toda. Já estava ficando incomodada. Observamos juntos um quase acidente de carro. Essa gente não respeita mais nada, nem faixa de pedestres! E de pensar que essa cidade já foi tão civilizada...
_ Não vai fazer seu último pedido?
_ Ah, é. Deixa eu pensar um pouco mais... afinal é o último.
Nessa hora tinha uma dúzia de formigas fazendo excursão pelas minhas pernas. Que aflição. Ri lembrando do vídeo do "Mati" (quem não viu?) e cometi alguns assassinatos sem culpa. Estou em dívida com a mãe terra, a fauna, a flora... arranquei algumas graminhas do chão também. Que se dane. Comecei a perceber que tinha muita gente curiosa ali em volta, olhando para nós. Coisa chata!
_ Pensou? Não tenho todo tempo do mundo, afinal.
_ Claro que não! - tentei manter a seriedade.
_ Diz logo: dinheiro. Todo mundo pede dinheiro!
_ Boa sugestão: dinheiro. Dinheiro sim que é bom e eu gosto como todo mundo. Anota aí que não vai ser simples. Quero ganhar na loteria. Assim ninguém suspeita de dinheiro vindo de fontes ilegais ou obscuras. Loteria é uma solução fácil e acima de qualquer suspeita. E tem o seguinte... a loteria vai acumular por semanas até eu decidir o dia em que for jogar. Quando jogar vou ganhar o maior prêmio já pago na história desse país. Ah, mas não vou ganhar sozinha. Quero que outras sete pessoas ganhem juntas. Cada uma de um estado do Brasil e todas devem ter nascido no mesmo dia que eu!
_ Nossa, quanta exigência. Agora vamos negociar isso tudo...
_ Negociar nada, que no início o senhor não botou preço em nada. Tem negociação nenhuma. Ou dá tudo ou não dá, mas negociar não negocio não.
_ Tá bom. Vacilei nessa. Mas me diga, pra quê dividir o prêmio com outras pessoas e essa frescurada toda delas terem nascido no mesmo dia que você?
_ Simples. Pra ter certeza que foi o senhor que fez acontecer... se ganhasse sozinha podia ser mera sorte, obra do acaso e ai como creditar isso ao seu trabalho?
_ Gostei dessa!
Levantei já bem dolorida, os anos começam a cobrar seu preço, isso de ficar sentada igual índio na taba é coisa pra quem ainda está no jardim de infância ou então faz ioga. Está tudo fazendo creck-creck. Se ganhar na loto volto pra ioga! Ai, melhor não reclamar da minha pobreza burguesa pra ele. Deveria ter arrumado outra sarna pra me coçar.  Despedi-me finalmente prometendo trazer mais livros. Acho que ele gosta mais dos meus livros do que da comida. Tenho dúvidas se rio ou não do papo maluco beleza. Senti um certo arrepio, a bem da verdade. Gente normal sai por aí adotando cães e gatos de rua. Tinha que ter me metido com um da minha espécie? Falta do que fazer total.
Isso que dá ter um mendigo de estimação.


2 comentários:

  1. ADOREI !!! ... EXCELENTE !!! ...

    VC PRECISA DIVIDIR ESSES TEXTOS COM MAIS LEITORES ,,, OUTROS MEIOS !!! ... URGENTE !!! ...
    MARIATH.

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