terça-feira, 2 de outubro de 2012

Quem sabe o que é certo faz a coisa certa. Certo?

"Às vezes ser uma louca em um hospício, é bem útil"
Ouvi algumas vezes isso: que quem sabe o que é certo acaba fazendo a coisa certa. Será? 
Imagino que sim, talvez seja verdade para a maioria das pessoas. Mas e se não for bem assim? De vez em quando me pergunto até onde vai esse certo ou errado no dia a dia de cada um. São tantas pessoas que se acham boas e fazem coisas erradas. Nada grave, mas pequenos enganos, coisas aparentemente inofensivas mas que acabam por flexibilizar a noção pessoal do que é (ou deveria ser) certo ou errado. 
Hoje consegui uma folga e corri na hora do almoço para dar um corte no cabelo, aproveitei uma promoção e fiz uma hidratação com um produto que disseram que é bom, coisa fina. Gostei do corte (nada demais, só aparei as pontas, mas ficou bem feito) e gostei mais ainda da tal hidratação (não vou ficar fazendo propaganda de graça, sorry), o que me deixou ensimesmada foi a conversa com o cabeleireiro. Ou hair stylist, como ele fez questão de se auto denominar.  Ele ficou tenteando o tempo todo, mas não sou de muito papo em salão, ainda mais desconhecido. Sem falar que estava me sentindo meio mal por ter "traído" a minha cabeleireira de sempre, mas foi algo de impulso, uma oportunidade.  Se arrependimento matasse. Bem, deixa isso pra lá. Voltando à vaca fria, no caso... ao boi, já que era homem. Ele foi jogando assunto, e eu usando a tática de sempre... ler-ver figurinha de revista, no caso dezenas de revistas de fofoca de novela e proto-celebridades antigas. Fiquei sabendo tudo sobre novelas que não assisto, super útil.
Até que ele resolveu falar sobre as eleições para vereador que acontecerão em breve, aff. Mordi a isca, não resisto à política, um dos meus pontos fracos. Deixei ele falar... já que meu título não é daqui, vou justificar, e portanto tanto estou assistindo tudo meio que à distância. Ele foi contando que tem uns 10 clientes que são candidatos a vereador. E que para todos dizia sempre que "podia contar com ele", "estamos juntos até o final", "que ele, a família e todos os amigos votariam nele", etc...  
Sabe aquela pessoa que deveria ficar quieto, ainda mais com uma cliente desconhecida, pois é. Que falta de simancol! Fui dando corda, pra ver até onde renderia a conversa mole e perguntei afinal em qual deles ele votaria. Respondeu que ainda não sabia, afinal eram todos "gente boa" e amigos dele. Resolvi aprofundar o tema, dizendo que isso não basta, que a pessoa tem que ser competente, instruída de preferência, interessada no bem comum, sensível para com as necessidades da comunidade, ter vocação para o serviço público, etc... Acho que ele nem escutou o que falei pois seguiu dizendo que todos eram "gente de bem", como ele, como eu. Como eu? Você nunca me viu antes, camarada! 
Aí, aquele ser cruel que de vez enquanto se manifesta em mim, resolveu fazer um teste, tipo pegadinha, e lancei a seguinte pergunta: Qual dos seus amigos candidatos trabalharia de graça como vereador, por puro amor ao serviço público e à comunidade? Afinal, o trabalho numa cidade de médio e pequeno porte, como é o caso daqui, não requer muito labor. Nada que impeça o vereador de continuar trabalhando normalmente e se sustentando como antes. Expliquei que o nosso país é um dos poucos (não me arrisco a dizer que é o único) que remunera o vereador, que normalmente é voluntário. 
A coisa começou a ficar engraçada, rs... Ele praticamente subiu nas tamancas dizendo que o vereador tem que ser pago sim, etc e tal. Que essa história de trabalhar sem receber é um absurdo, et cetera. No começo não entendi bem aonde ele queria chegar afinal, concordou comigo que o trabalho era pouco, e que sim dava para conciliar com o trabalho, coisa que a maioria realmente fazia. Fiquei me questionando qual era o ponto, onde ele queria chegar com essa defesa do salário do vereador. Quem paga as contas somos nós, através dos impostos, não seria melhor cortar esse custo e investir em projetos sociais e no desenvolvimento da cidade como um todo?
Sabe aquele lance de ironia socrática? De fingir-se ignorante para forçar o outro a mostrar sua verdadeira face, trazendo à tona sua motivação interior? Basicamente a arte do diálogo, trazer à luz o que não está exposto. Sócrates para o maternal, beabá da filosofia. É um truque bobo, ainda mais se o seu dialogante for um ser totalmente sem juízo e falastrão. Santo Sócrates que estais nos céus, olhai por nós!
Acabei descobrindo, tristemente, que o "sonho" da vida dele era ser vereador, e que não tinha conseguido dinheiro suficiente para participar dessa campanha, mas que na próxima, aha!, estaria concorrendo. E, claro que não abriria mão do salário, que era bom demais. Nem preciso dizer que meu queixo foi no chão, deu uns dois ou três quiques e voltou ao lugar. O que mais poderia dizer? Aquele cara estava fazendo massagem no meu cabelo, era "gente boa como eu", e tudo que queria na vida era ganhar os honorários de um vereador. Fiquei passada, bege total. Quando digo que a única maneira de viver é bancar a louca, me dizem que sou l o u c a. Sou não, a questão é que estamos mesmo vivendo num hospício onde quem vê ou faz o certo está errado! Resolvi dar mais corda pro tratante (sim, nesse momento já me via num universo paralelo, como num filme nonsense) e perguntar sobre quais eram seus projetos e planos para a cidade, já que ele sonhava há anos em entrar na política. Vou resumir: ele não sabe, não tem e nem acha isso importante. Disse que quando chegar lá descobre, mas acha que não deve ser muito difícil já que qualquer um pode ser eleito.
Então tá, né? Fazer o quê?
Sim, para fechar com chave de ouro, depois de ter terminado o serviço (muito bom por sinal), é óbvio que  pediu meu voto daqui a 4 anos. Pensei até em dizer que "claro, ele poderia contar comigo" ou "estamos nessa até o fim", mas não consegui. Disse a verdade laconicamente, que meu título de eleitor é de outro local e que não votarei aqui  nem agora nem daqui a 4 anos. Acho que ele ficou meio decepcionado. 
Mais decepcionada fiquei eu com a verdadeira inversão de valores que virou normal na nossa sociedade. 
Agora me diz, esse cara sabe o que é certo? Penso que talvez eu que não saiba mais o que é correto ou não.  
Moral do causo: estarrecida mas com cabelos brilhantes e hidratados!

14 comentários:

  1. QUALQUER UM PODE SER ELEITO? Sério que ele disse isso?

    Eu poderia recorrer ao clichê "por isso que o país está desse jeito"; mas o pior é saber que, se até mulheres frutas estão acreditando que serão eleitas (e talvez até sejam), ele não está muito longe da verdade...

    Triste saber que, hoje em dia, ninguém pensa no trabalho que terá ao ingressar como políticos representantes de um lugar (município, estado, país), só no quanto vai poder ganhar. É como quem diz "sempre quis trabalhar na fábrica de chocolates" e não sabe como trabalharia lá, só que ia ganhar chocolate de graça...

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    1. Fazer o quê?!?
      Quem me dera ao menos uma vez ver ... Legião na cabeça!

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  2. Eu acho que a nossa política não tem mais conserto. Já fui chamada de radical, já me acusaram de não ser patriota, de não amar o meu país, de generalizar, e todo o blábláblá de sempre. Mas infelizmente, o conceito de "certo" se tornou tão subjetivo, que a gente não sabe mais qual é. Infelizmente (sim, digo infelizmente porque como pessoas tb são "gente boa", não são é bons cidadãos, penso eu) tenho alguns amigos e conhecidos engajados na política, candidatos e quetais. Não voto em nenhum deles. Têm propostas estapafúrdias, onde se preocupam com "vamos tornar o mundo vegetariano" ou "vamos construir ciclovias e parques", "vamos alimentar cães e gatos de rua", e não falam em problemas mais reais e efetivos, que batem à nossa porta todo dia, como uma pessoa morrer na fila do SUS aguardando um exame, ou uma mãe não poder trabalhar porque não há vaga suficiente nas creches públicas. Se paga imposto sobre imposto, mas agora aqui em Porto Alegre, há uns bons anos, qualquer chuvinha (nem falo nesses temporais que andam acontecendo, né?) alaga a cidade toda, impossibilita a circulação das pessoas, e olha, não vi UM candidato falar sobre isso. Nem sobre o crescente numero de assaltos na cidade.
    Enfim, a gente se espanta, mas a Grasi tem razão. Quando o cabelereiro disse que qualquer um pode ser eleito, infelizmente ele não está muito longe da verdade.

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    1. O triste é que ele está certo... qualquer um mesmo pode ser eleito.
      Nos deram espelhos e vimos um mundo doente
      Tentei chorar mas não conseguiiiiiiiiiiiih ... ainda com Legião na cabeça!

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  3. eu sei que não é engraçado, mas estou morrendo de rir. E me lembrei do meu pai. Nós moravamos numa cidade bem pequena, uns 15 mil habitantes e os dois candidatos a prefeito eram nossos amigos. E os dois contavam com o voto do meu pai. O que ele fazia?
    Dizia prá cada um que ia votar no outro. Isso mesmo. Pedia desculpas, mas dizia que o voto dele era do adversário... até hoje ninguém sabe em quem ele vota.
    O voto é secreto, certo??

    Mas eu sei que a sua estória não tem nada a ver com o fato do cara mentir pra todos os candidatos-clientes. E confesso que um amigo meu da Nova Zelandia, entrou prá camara exatamente pelo mesmo motivo.
    Ele achou o salário interessante, o horário compatível com o trabalho dele, se candidatou, ganho e é um dos vereadores mais atuantes da cidade.
    Briga por causas justas, faz um trabalho ótimo. Mas a motivação dele também foi grana. E ele mesmo diz: meu outro trabalho eu também faço pelo dinheiro, mas exatamente por que sou pago para fazer, tenho obrigação de fazer um trabalho bem feito. Na política não é diferente. Estão me pagando, eu tenho obrigação de defender o interesse de quem me elegeu...

    Eu, que não voto nem cá nem lá e nem gosto de politica, assisto de camarote. :-)

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    1. O causo do seu pai me lembrou de outro... não conheci o político, era pequena... mas lembro do meu falecido avô, de tios e cia contarem desse prefeito (lá no feudo da mamily) que era sapateiro. Ele dava um pé de sapato antes da eleição em quem prometesse votar nele e só entregava o outro SE eleito. Pior que dizem que era bom prefeito e foi eleitos várias vezes.
      Sei lá, acho que em matéria de política (de verdade) ainda estamos nas cavernas... é isso.
      Quem dera se os nossos políticos fizessem ao menos como o seu amigo, que entende que está sendo pago para trabalhar bem, já seria um avanço e tanto!

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  4. O Brasil esta o que esta porque todo mundo acha que sabe o que eh o certo... Suspiros!

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    1. É... e esse "certo" varia conforme o $$$ da caixa 2, 3, 4251323, infinito...

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  5. Acho que a maioria dos brasileiros sabe o que è certo ou errado. O problema è que estao ocupados demais pensando em coisas inuteis que julgam importantes. Ou, como uma patricinha estupida comentou uma vez em meu blog: "To nem aì. Sò quero um banho quente em uma banheira cheia de espuma. To cansada demais pra ter principios"... Acho que a frase dela retrata bem "a real" do brasileiro.

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    1. Pois é... tem hora que a gente nem sabe o que dizer: Dá para imaginar alguém cansada demais para ter princípios?!?! Choquei!

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  6. Já que falou em Sócrates, uma das idéias de Platão era que a sociedade era o homem com H maiúsculo, o que ficou conhecido como o princípio antropológico. Ele queria dizer que a sociedade, no geral, não era melhor ou pior do que os indivíduos que a constituem. Quando vemos nossos políticos fazendo o que fazem fica a pergunta: de onde vieram? De Marte? Ou vieram da própria população brasileira?

    Para Platão, a resposta era clara: são amostras da nossa própria sociedade. Quantos brasileiros não fariam no poder o que os atuais titulares fazem? Quantos em seu microcosmos não fazem coisas parecidas mas não se dão conta? Estou falando de pedir um recibo a mais para justificar uma diária, uma sonegação de IR aqui, um troco a mais que não devolve, um erro na conta para menos que não acusa.

    Longe de mim dizer que todo mundo é assim, nem mesmo a classe política é toda constituída de corruptos. Mas o seu cabelereiro só demonstra porque temos o nível de políticos que temos e porque o apedeuta foi mitificado.

    Só em um país onde a ética e moral encontra-se completamente corrompida é capaz de perpetuar no poder a turma que está lá.

    Sobre esse assunto, recomendo o livro " Hitler e os Alemães" do filósofo Eric Voegelin, que recorre ao princípio antropológico para explicar como a socidade alemã aceitou Hitler. Ensina mais sobre o Brasil do que toda a sociologia brasileira das últimas 4 décadas pelo menos.

    Excelente texto! Parabéns.

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  7. Obrigada, Jr.
    Bem, não há como dissociar Sócrates de Platão. O que sabemos do primeiro vem basicamente dos relatos do segundo. Preciso dizer que concordo em gênero número e grau com seu coment? Acho que não. Vou procurar esse livro, deve ser bom.

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  8. Olá Geíza!
    Dá licença, tô chegando por aqui através de comentários teus que vi pelo Face e que considerei bastante coerentes, portanto, uma pessoa que está paralela com meus pensamentos também.
    Pois é, estamos vivendo um momento muito louco neste nosso país, onde pessoas sem noção de nada, principalmente de política, querem, sonham em entrar para ela para ganhar dinheiro e o que estamos assistindo é tanto louco varrido se candidatando e, possivelmente, ganhando. O resultado será um país cheio de tecnologias, gente copiando o modo de vida americano e tudo na mesma, bem atrasado em quase todos os segmentos e a corrupção tirando totalmente nossa esperança de um mundo melhor.
    um grande abraço, carioca



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    1. Seja mais do que bem vinda, Beth carioca!
      Acho que um blog não é feito só por uma única pessoa - ainda que na maioria das vezes escreva para mim mesma - e sim em conjunto... a alma dele está nos seus comentaristas. Junte-se à turma, que é pequena, mas boa demais!

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